EDITORIAL

AINDA HÁ QUEM NÃO SAIBA QUE GOSTA DE TEATRO

 A Mostra de Teatro de Santo André continua a ser necessária porque as pessoas o exigem, porque algumas aprenderam a gostar de teatro com ela, e porque muitas outras ainda não sabem que gostam de teatro e descobrem-no em cada nova edição. 17 Mostras consecutivas com assinalável sucesso é um património significativo, tanto mais que um festival de teatro consistente não surge do nada, mesmo quando existe por detrás uma vontade política e a capacidade financeira para o realizar, porque ele é sobretudo a festa da comunhão do público com as obras e com os seus criadores. De facto, a Mostra emergiu há 17 anos na Escola Secundária de Santo André fruto de uma forte dinâmica teatral que já tinha transposto há muito a vedação escolar e contagiado a população e o Meio. Daí para cá, cresceu em dimensão, em ambição e em qualidade, refazendo-se e aperfeiçoando-se com os sinais do público. A Mostra cresceu na afluência de espectadores às salas de espectáculos e na sua exigência crítica, mas também no reconhecimento e respeito das estruturas de criação, nacionais e estrangeiras, por este esforço de promoção do teatro junto de largas camadas da população com excelentes resultados, ano após ano melhorados. Mas um festival precisa de ter a possibilidade de crescer e de se desenvolver porque as expectativas dos espectadores e dos próprios promotores crescem sempre mais à medida que se avança. Ninguém duvidará que a Mostra é um caso de sucesso artístico em Portugal! Mas apesar do quadro de mudança da conjuntura nacional que estas últimas eleições nos trouxeram, continua a ser muito difícil concretizar actividades desta natureza. A cultura continua na primeira linha do “supérfluo” onde a falta de investimento tem um impacto menor na opinião pública. Não havendo uma grande capacidade de resistência e convicção dos promotores culturais e também uma boa dose de paixão e “loucura”, que por vezes se confundem, projectos como a Mostra dificilmente podem planear o futuro a médio prazo e muito menos crescer e desenvolver-se, apesar de todos os indicadores de sucesso que possam apresentar. Resta, portanto, manter a esperança de melhores dias, aproveitando a inegável onda de público gerada ao longo dos anos e o apoio de parceiros, como as autarquias locais e algumas empresas mais conscientes da sua responsabilidade social que, com o seu incentivo, nos impelem a não desistir. A Mostra deste ano fica marcada pela renovação física e técnica do auditório da ESPAM, sede deste festival desde a primeira hora. As obras de beneficiação, patrocinadas pela Câmara Municipal de Santiago do Cacém, permitiram renovar esta sala, tornando-a mais confortável e eficiente e acolher de forma mais digna as companhias de teatro e as suas montagens cénicas. Mas esta intervenção, na sequência de outras que o GATO SA e depois a AJAGATO têm vindo a promover ao longo de quase 30 anos de utilização deste espaço, presenteiam acima de tudo o público da região que merece como nenhum outro ver o seu interesse e entusiasmo reconhecidos pelo poder local. Enquanto não pudermos contar com uma infra-estrutura cultural feita de raiz, o auditório da ESPAM terá agora melhores condições para continuar a cumprir o seu desígnio de sempre: ser a sala de visitas desta cidade. Penso mesmo que não exagero se disser tratar-se do espaço cultural mais importante do Alentejo Litoral se considerarmos a dinâmica aqui gerada e a importância e consistência dos projectos que alberga e a que deu origem em cerca de trinta anos de existência. Esta 17ª MITSA foi preparada nos moldes minimalistas de há uma década: duas ou três pessoas, a experiência acumulada e rotinas que felizmente nos permitem pôr de pé o festival. Como habitualmente, valeram-nos os amigos e a rede de cumplicidades que se reforça ano após ano. Recorremos obviamente à autarquia local, contámos com o efeito facilitador das sinergias desta região e, naturalmente, com a estrutura escolar onde aliás o projecto sempre esteve ancorado. Mas a fórmula está esgotada há muito! A dimensão do festival reclama outra estrutura organizativa e uma equipa mais alargada e profissional que permita assegurar este longo processo de preparação com maior eficácia e menor esforço individual, só suportáveis pela paixão que nos move. No entanto, como em todas as paixões, este trabalho obsessivo e avassalador é também inevitavelmente uma fonte de angústia e insegurança e neste momento em que damos início a mais uma edição espero que o público, a quem todo este trabalho se dirige, responda mais uma vez com a sua presença numerosa e o seu entusiasmo, justificando plenamente todo o trabalho de quem a preparou ao longo de muitos meses e o interesse de quem, acreditando no projecto, lhe deu o seu apoio e o suporte financeiro.

 Detalhes e Destaques 

Começamos no dia 1 de Junho, assinalando o Dia Mundial da Criança com dois espectáculos de grande qualidade dirigidos aos mais novos. Até terminar, no dia 26, teremos apresentado um total de 36 sessões de teatro em 12 localidades, desde Faro a Setúbal, relativas a 15 espectáculos diferentes trazidos por 13 companhias profissionais de teatro nacionais e estrangeiras. De realçar o aumento do número de espectáculos a apresentar em Santiago do Cacém e a vontade da Junta de Freguesia de Alvalade de este ano acolher um espectáculo. De igual modo se aplaude o aumento significativo do número de extensões, mostrando a importância que o festival vai despertando numa área geográfica cada vez mais alargada. O programa deste ano mantém as principais características da Mostra, quer no que respeita à diversidade das propostas quer na exigência qualitativa dos espectáculos. No entanto, foi preparado com particulares cuidados financeiros, de modo a tentar manter o equilíbrio orçamental e uma das soluções encontradas foi o rentabilizar a vinda de alguns espectáculos com a sua apresentação num maior número de salas. A 17ª MITSA traz-nos de volta algumas companhias que há vários anos não apresentávamos como é o caso da BAAL 17, FONTENOVA, TEATRO INVISÍVEL, CASEAR e COMUNA. Outras programamos pela primeira vez, cientes de que correspondem aos elevados padrões de exigência do público, como é o caso do premiado TEATRO GRIOT, com uma encenação do grande encenador Rogério de Carvalho, e o novíssimo PLOT TEATRO dirigido por John Mowat, responsável por todos os trabalhos que a Cª do Chapitô já trouxe a Santo André. De regresso teremos a Companhia da Esquina com uma actriz do GATO, a Inês Patrício, bem como o Teatro dos Aloés. Um destaque natural para as duas companhias internacionais: CIA COCOTTE de Barcelona, com um divertido espectáculo apresentado por um elenco de 6 jovens actores e o grande e experiente actor PAOLO NANI, que nos chega da Dinamarca, com um espectáculo que é já um clássico do seu repertório, apresentado mais de mil vezes em cerca de 40 países e com quem preparámos a linha gráfica deste ano. Uma satisfação muito especial em nos associarmos ao 44º aniversário da COMUNA com uma comédia que esperamos possa atrair um elevado número de espectadores graças ao extraordinário elenco que o integra. De resto, abrimos mais uma vez com os amigos do TEATRO DO MAR e encerramos formalmente, à imagem do ano passado, com um espectáculo de teatro musical pela ACADEMIA INATEL, embora no dia 3 de Julho ainda haja lugar à apresentação do Teatro do Mar na quinta do Chafariz em Santiago do Cacém. A estrutura do festival inclui como habitualmente as actividades complementares, onde sobressaem o Workshop sob a direcção de Paolo Nani; as animações antes dos espectáculos de teatro, generosamente trazidas por diversos artistas locais e também do Conservatório Regional de Setúbal; as “Abaladiças”, onde o público pode contactar de perto com actores e encenadores; uma Exposição de Aguarelas de Ana Reis, uma artista oriunda desta região e do GATO SA; e o que mais se verá ao longo deste mês de teatro em Santo André.