FLASH INTERVIEW
- Sendo actores italianos, por que razão se
estabeleceram em França?
Foi por uma casualidade. Após a nossa
formação universitária em Itália, descobrimos que existia uma escola em Paris,
de teatro popular e gestual. Essa formação assentava em raízes italianas e isso
interessou-nos. Assim sendo, decidimos emigrar.
- Nesta época de crise económica
internacional, como está o teatro em Itália?
A situação do teatro em Itália é crítica,
mas isto já há mais de 30 anos. Não existe nenhum mercado teatral. As portas
dos teatros não estão abertas a novos criadores e o sistema de apoios está
fechado sempre nos mesmos nomes há cerca de 30 anos, o que rouba qualquer possibilidade
aos jovens artistas. Mesmo nas cidades com maior actividade cultural (Roma,
Milão, Turim, Génova) é impossível a sobrevivência de um jovem actor sem
recorrer a trabalhos fora da área de formação. Em Itália, a crise no teatro
chegou muito antes da crise financeira e é resultado de uma vontade política de
divisão social, ao invés de estimular a coesão e a reflexão. Não é por acaso
que os melhores exemplos do nosso teatro, dos últimos 30 anos, surgem em
realidades não institucionais.
- E
em França, como está a situação?
Não existe uma comparação possível entre o
estado da cultura em França e em Itália. Em Itália nunca existiram montras
teatrais como, por exemplo, o Festival de Avignon, no qual qualquer companhia
pode alugar uma sala e apresentar um espectáculo que acredita poder interessar
aos programadores. Não existe em Itália uma política de sustentabilidade para
os profissionais do espectáculo e a própria profissão de actor não é
categorizada como é qualquer outra área profissional.
A rede de programação teatral é muito
fechada, como já dissemos. Ser incluído na programação de algum teatro sem se
ter uma visibilidade televisiva interessante ou algum conhecimento mais
privilegiado é quase impossível.
O mercado é lento e desgastado,
consequentemente o público é rotineiro e nada desperto para a inovação. Os
jovens quase não frequentam os espaços culturais e desconhecem a possibilidade
de se divertirem ou emocionarem num teatro, a não ser que se trate de um
cabaret televisivo.
Em França a situação é muito diferente! O
público está em busca contínua por novidades. Para além disso, o teatro é parte
integrante dos projectos pedagógicos para a infância, bem como uma ferramenta
para a integração racial.
O mercado teatral é rico em pequenas e
grandes salas privadas que abrem as suas portas constantemente. Se bem que a
crise financeira começa a dar sinais de vida também por aqui. No ano passado
observámos uma redução significativa no número de público presente.
- Qual deve ser o papel do teatro em
geral nos dias de hoje e o da Comedia
dell’Arte em particular?
O papel do teatro permanece o mesmo que
ditou o seu nascimento, ou seja, o de servir de espelho à sociedade com o
intuito de revelar os paradoxos e estimular a tomada de consciência das várias
realidades sociais.
O teatro permanece ainda hoje um ritual que
nos emociona através da reflexão, e nos leva a reflectir através das emoções.
O papel da Commedia dell'Arte, nesta sociedade que tende ao individualismo e a
transformar a cultura num privilégio para poucos, é o de democratizar o teatro
e a cultura.
Do nosso ponto de vista, a Commedia dell'Arte é hoje uma prática
propedêutica para quem quer fazer teatro. A aprendizagem da Commedia dell'Arte, nos dias de hoje,
equivale ao ensinamento das escalas na formação de um músico. Saber comunicar
verdade numa acção cénica, apenas através das técnicas de representação,
permite ao actor uma tomada de consciência dos códigos teatrais e estimula-o a
compreender que quem sobe ao palco tem uma responsabilidade muito real no que
diz respeito a quem paga para ver e à própria sociedade que ele intenta
representar.